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quarta-feira, 29 de maio de 2013

Chuva

Poucas são as coisas mais bucólicas que a chuva.

Observá-la.

E não sem sentido fictício como esta narração.

Percebê-la, com a pele, com o nariz, os olhos e escutar a belíssima música que de longe as nuvens preparam...

A dança entre vento e chuva, chuva e vento imita movimentos de dedos tentaculares invisíveis que massageiam a terra já tão desgastada e tensa.

Sua voz é suave, coletiva, ressonante de grande amplitude e de presença ainda maior. São micros e milhares de gotículas que a uma velocidade tal, teima em quase se encontrar e por vezes se encontrar no solo com outras milhares e micro gotículas que repousam ao mesmo tempo.

Não de modo tranquilo. Elas se espatifam e se espalham em outros tantos pedaços.

No conjunto, escorrem e tocam os galhos...

Seu brilho relâmpago do céu marcam sua passagem, iluminando seus segundos em segundos de sua espetacular performance!

O cheiro, penetrante, a brisa suave e úmida que refresca os lábios e fecham os olhos que podem em também um só conjunto apreciá-la.

Observar: seu som, seu cheiro, seu toque, sua sensação e seu preenchimento.

Como que abastecendo micro e milhares de células que se alimentam de milhares e micro partículas de água.

Sacia-me. Respiro-te.

Que delícia de chuva!

Seu horizonte. Suas formas. Suas cores. Suas pequenas distorções de feixes de luz.


quinta-feira, 23 de maio de 2013

Reprodução

Uma pessoa diz:

- Sou cientista. Por isso sou o patrono da verdade. A psicologia, a medicina, as ciências sociais: tudo isso me pertence e fornece a resposta verdadeira.

Outra pessoa retruca:

- Jamais! Somente a filosofia é capaz de demonstrar a verdade. A filosofia é a verdade, e eu, como filósofo, sou capaz de trazer a verdade!

Mais alto que todos os outros o terceiro diz:

- Arrependei-vos, pois somente a religião é verdadeira. Sou a palavra de Deus e independentemente do nome que o chamarei, sou o religioso e sou a verdade. Aliás, sou tão verdadeiro que posso até definir o que é religião ou não, o que é santo ou não, o que é verdade ou não.

E por fim, há o artista, que em suas manifestações prefere dizer:

- Tudo isso é besteira! Só a arte tem a verdadeira expressão do espírito. Por isso, quando toco, pinto, danço, represento, estou sendo o verdadeiro.

Pobres homens. Continuarão se achando os verdadeiros até que acabem uns com os outros, enquanto poderiam perpassar suas crenças e unir-se em amor e verdade.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Devaneios nada ortodoxos

"Segue-se o padrão..."

Alguém diria.

Entretanto, são tantas idas e vindas de progressos e retrocessos que fazem o tempo parecer algo tão inútil como só uma ficção barata poderia ser.

Uma xícara de café certamente me animará.

A mente continua a mentir.

Sabe-se lá que dia isto mudará!

Ao invés, posso desmaterializar a fonte do conhecimento que se diz conhecido e desistir dessa busca tão inútil como só o tempo poderia ser.

Acho melhor acender um charuto. A tensão já me consome como não me lembrava ser possível.

A mente mente.

O fogo. Preciso do fogo. Acho melhor esquentar a água. Um café me fará sentir melhor.

Talvez melhor seria se ouvisse um jazz. Duke Ellington e John Coltrane. Como gosto desse disco.

A faixa 2! Não quero a primeira. Se ao menos soubesse alguma coisa de inglês.

Mas vai saber se isso existe! Só ouço ou vejo em alguns filmes que por vezes passam na tv.

A água está quente. Melhor me preocupar com o café. Uma xícara de café melhorará tudo.

Certamente.

Onde diabos deixei o charuto?

O cheiro do contato é muito bom. O fogo e a panela. A panela e a água. A água e o café. O café e a língua.

Que cheiro bom de café. No coador de café.

A vista não é sempre observada. Uma lua. Um degradê. Um pôr do sol onde não se vê o sol mais.

Parecem nuvens desenhadas. Melhor...recortadas de uma fotografia e coladas sobre o degradê.

Uma xícara de café. Não faz diferença. Uma só xícara de café. Afinal, para que outra xícara? Uma só basta.

Uma lua. Uma xícara. Um café. Um charuto.

A mente não cansa.

São tantos pensamentos em desencontros. Tantas ideias que insistem em se dizer melhores. Como pode?

E como poderei conhecer tudo?

O contato. O dedo e o fósforo. O fósforo e a caixa. O fósforo e o charuto. O charuto e os lábios. A fumaça e a boca. A fumaça e o vento. O degradê. O sol e a lua.

São só ideias. Qual delas contém a verdade? Se é que alguma contém a verdade.

O sentimento. Quanto ao sentimento não há inverdade. O sentimento do jazz. O sentimento do café. O sentimento que se sobrepõe à ideia. O sentimento de lua.

Um gole de café. Uma baforada. Uma visão de degradê.

Com tanto céu. Com tanto degradê. Com tanto café. Com tanta fumaça. Com tanta mente, que mente e mente. Com tanta lua. Como pode ser verdade? Uma mente ou um café? Uma ideia ou uma afirmação?

A mente não para. Não quer parar. Outra baforada. Um gole de café.

- Adoro essa música!

São ritmos constantes. De um lado ao outro. Indo e vindo. Progresso e retrocesso. A mente mente.

Não há pensamento em vão.

Não há verdade no pensamento. Há verdade. Não há. Há.

Outro gole de café.

Eu quero o sentimento. O feeling como se dizem nos filmes que vejo às vezes na tv.

O jazz.

Uma xícara de café.

Um charuto.

Nada ortodoxo.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Discurso em defesa da redução da maioridade penal

Este é um discurso que farei em um dia qualquer.

Não será hoje, pois estou demasiadamente indignado, para não dizer cansado ou acomodado.

Só o escreverei aqui para não me esquecer de dizer um dia. Acho que será assim:


Este é abertamente um discurso em defesa da redução da maioridade penal. É absurdo que esses jovens pratiquem barbáries como essas. São massacres como antes nunca vistos pela história da humanidade. Essas "crianças" são sadistas em busca de um pouco de diversão a custa da vida de inocentes.

Eles cravam seus dentes em nossa carne sem nenhuma piedade, buscando apenas se saciarem. Não se importam em rir da nossa cara como palhaços!

Infração é eufemismo para o que eles fazem: são capazes de mudar a vida de outros para sempre. As marcas que deixam são inesquecíveis, e não haverá medidas que anulem isso.

São claramente egocêntricos, acreditam que o mundo gira em torno deles mesmos! E o pior, somos nós mesmos quem os financiamos e os alimentamos. Eles nos obrigam a custear toda a sua vida, para depois, simplesmente saírem por aí, a fazer o que querem. Não seguem a educação e a moral que a sociedade demonstra.

E não me venha dizer que esses maníacos não sabem o que fazem! Sim, são extremamente conscientes.... Atualmente os cientistas mais estudiosos dos lugares mais desenvolvidos fora do Brasil dizem que esses rebeldes respiram e já sabem o que fazem.

Se come, bebe, grita e já brinca com o chocalho....

Se chupa bico, tem idade pra tá na cadeia!

Não deixemos que mais inocentes sofram com essa barbárie!

Eu apoio:

Redução da maioridade penal 18 meses!

Jamais eles tocaram nos meus bens, bandido é bandido, queremos um plebiscito para a redução da maioridade penal!


Ass.: O Palhaço do Circo Sem Futuro

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Diálogos de encarcerados


Naquele 1º de Maio, uma banda visita o presídio. É uma forma de recompensar os trabalhos forçados daqueles prisioneiros.

Sob o fedor de ambiente putrefato e carcomido, centenas de milhares, milhares de centenas, centenas de centenas ou inúmeros agentes tinham em mãos folhetos que silenciavam a festança que os cercava:

"O primeiro de maio é um dia extremamente importante na história dos povos modernos.

Em 1886, na cidade de Chicago, ocorreram as grandes manifestações para redução da jornada de trabalho que ficaram conhecidas como REVOLTA DE RAYMARKET, com a morte de diversos ativistas, que impulsionaram outros protestos pelo mundo e culminaram no início dos direitos trabalhistas.

Ainda hoje, mais do que nunca talvez, o homem se vê muitas vezes aprisionado ao trabalho. Sem tempo para a família, para o lazer, para o estudo. Principalmente nas metrópoles, onde o trânsito e o ritmo imposto para se pagar a 'sobrevivência' chega a ser absurdo em inúmeros casos.

É preciso refletir sobre os caminhos dessa nossa modernidade...aonde o progresso está nos levando? Estamos ficando mais livres...ou mais aprisionados com a evolução desse sistema?

Só neste ano - de todo o ORÇAMENTO PÚBLICO DO [PAÍS] (o montante que deve ser destinado à saúde, educação etc.) quase 50% foram diretamente para o pagamento dos JUROS DA DÍVIDA que temos com os banqueiros, nacionais e internacionais.

No fim das contas....quase todos trabalhamos para sustentar esse modelo de [prisionismo] baseado na DÍVIDA, nos JUROS e na exploração.

É preciso acordar e lutar!

Nem só de festa vive o HOMEM!"

Em meio à multidão, um deles ousa sussurrar:

 Gostei deste texto.

Um pouco além do seu ombro direito, uma voz anciã retruca, à medida que se aproxima do ouvido daquele primeiro a se manifestar:

 Justamente agora e neste dia, é importante dizer que os nossos representantes internos não trabalham mais para a redução da hora de trabalho, permanece a escravidão do deslocamento e imposição do local e da forma de execução do trabalho ou dos nossos estudos. E o que é pior, tal pensamento retrógrado espalha-se como uma epidemia virtuosa – como se isso existisse – e contamina a todos os setores, internos e externos, privados e públicos, sendo certo que pareceres, obras de arte, projetos e artigos são tratados, atualmente, como peças de montagem que devem ser produzidos em massa e com meta pré-determinada... Acham que um projetista, desenhista, programador etc. terá melhor capacidade de produção e inspiração.

Uma mão toca o ombro do primeiro manifestante. E a voz anciã conclui:

 Onde estão os militantes de hoje?

Um suspiro profundo e sincero demarca o tempo indefinido que precede a resposta, e então, o diálogo continua com os olhares rasteiros do primeiro manifestante:

 Estamos acuados, controlados, sob medida de falsas ideologias e talvez até de um certo comodismo, ou descrença sobre a possibilidade de sermos tão controlados. – Seus olhos inquietos parecem buscar no chão uma saída para situação tão incômoda. Antes de se ver ainda mais cercado a continuar a exclamar:

 Nos escondemos atrás de máscaras, veiculamos uma série de informações inúteis, enfim, continuamos a seguir os passos necessários para sermos considerados apenas “peões de um jogo”.

O desespero do primeiro manifestante é interrompido pelos dizeres, responsáveis pelo levantar de sua cabeça, emitidos pelo ancião, enquanto este aponta indiscriminadamente para a festança que os circunda, por dentro e por fora:

 E ainda batemos palmas para as medidas que vão nos manietar e nos conduzir para a nossa própria execução!

Os olhares de ambos escorriam entre si mesmos e para todo o presídio, enxergando agora animais sendo preparados e engordados para o abate.

Até que o primeiro manifestante, finalmente, contesta:

 Estamos sob rédeas tão curtas, que pensar em um 1º de maio como um dia reflexivo ou um dia de ócio ao invés de um dia de “interrupção do trabalho”, seria considerado utopia!

Seus olhos não buscam mais o chão, estão, agora, direcionados para si.

Inala-se, exala-se. Quando a parte verbal termina, a revolução individual tem início.



* O texto do panfleto retirado, levemente alterado (em formação, e foram trocadas algumas palavras que estão entre colchetes), de autoria da banda Famílias Gangters postado por sua página no Facebook em 1º de maio de 2013.
Os diálogos foram inspirados em diálogos ocorridos neste dia.
Todos os fatores produtivos são inspirados em "fatos reais".